Poesias de Dom Pedro II/13
CINCO DE MAIO.
( Trad. de Manzoni. )
Morreu e, qual marmoreo,
Sôlto o postremo alento,
O corpo jaz exanime,
Orphāo d՚um tal portento;
Assim sorpreza, attonita,
A terra co՚a nova está.
Muda pensando na ultima
Hora do homem fatal,
Nem sabe se tāo célebre
Planta de pé mortal
Seu pó de sangue avido
Inda pisar virá.
Fulgido sobre o solio
Meu genio o viu; calou-se
Quando, por vezes varias,
Cahiu, surgiu, prostrou-se
A minha voz d՚innumeras
Ouvido nāo terá.
Virgem de vil encomio
E de covarde insulto,
Surge, abalado ao subito
Finar do ingente vulto,
E solta á urna um cantico
Immorredor quiçá.
Dos Alpes ás Pyramides,
Do Manzanar ao Rheno,
Elle fuzila; e rapido
Raio é o seu aceno.
Troou de Scylla ao Tanais
D՚um até outro mar.
Foi vera gloria? Aos posteros
A ardua sentença; a nós
Curvar a fronte ao Maximo
Factor, que d՚elle apoz
Quiz de seu almo Espirito
Rasto maior deixar.
O procelloso e trepido
Prazer d՚um grande plano ,
A ancia de quem indomito
Serve p՚ra ser sob՚rano,
E o é; e ganha premio,
Que era mania esp՚rar;
Tudo provou; a gloria
Maior depois dos transes;
A fuga e a victoria;
Do paço e exilio os lances;
Duas vezes no pó infimo;
Duas vezes sobre o altar.
Seu nome diz: dous seculos,
Um contra o outro armado;
Humildes vāo render-se-lhe
Como aguardando o fado.
Impoz silencio, e arbitro
Entre elles se sentou.
E foi-se | E os dias no ocio,
Em praia exigua finda;
Alvo de inveja livida,
E de piedade infinda;
D՚inextinguivel odio,
E amor, que nāo mudou.
Como a cabeça ao naufrago
A onda verga e envolve;
Onda na qual o misero
De cima a vista volve,
E a divisar esforça-se
Praia remota em vāo;
Tal da memoria o cumulo
Sobre aquella alma cae.
Que vezes elle aos posteros
A si narrar-se vae;
E sobre a eterna pagina
Tomba a cansada māo!
Que vezes elle, ao tacito
Morrer d՚ignavo dia,
Baixo o olhar fulmineo,
Braços cruzados, via
Os dias que já forāo-se
A mente lh՚ assaltar!
As moveis tendas lembrāo-lhe
Dos muros os abalos,
Dos sabres os relampagos,
A onda dos cavallos;
O concitado imperio,
O prompto obedecer.
Talvez ao crú martyrio
Cedeu o forte seio;
Desesperou; mas valido
Braço celeste veio,
E para um ar mais limpido
Piedoso o transportou.
E guia-o pelo flórido
Trilho da esperança
Ao campo eterno, ao premio
Que além do almejo avança;
Onde é noite, é silencio
A gloria que passou.
Bella, immortal, benefica
Fé, a vencer affeita,
Inda isto escreve: alegra-te,
Que alteza mais eleita
Ao deshonor do Golgotha
Jamais se prosternou.
Tu, d՚estas cinzas frigidas,
O impio fallar isola.
Deus que te abate e eleva-te,
Que te afflige e consola,
Sobre o deserto thalamo
Ao lado seu pousou.
![]() | ||||
Original: |
| |||
Translation: |
|