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Page:Poesias de Dom Pedro II.pdf/170

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O CHORO D’UMA ALMA PERDIDA.

 

Poesia de Withier.

 

No mato escuro, aonde, o dia já ausente,
Deslisa-se o Amazonas, qual uma serpente,
Do pôr do Sol á aurora tenebrosamente,
Como d’alma penada na floresta errante,
Chôro extenso, gemido d’ erino cruciante,
E das trevas, o bem d’ali então distante,
Tanto abala o viajôr com o horrido sonido
De angustia e de terror, que todo combalido
Lhe para o coração, e escuta commovido.
Qual ao dobre d’un sino, o guia estremecendo
Larga o remo na borda, e logo se benzendo,
Diz baixo: « Alma perdida! Eu bem a comprehendo.
« Não é passaro, não, Senhor; é algum damnado
« Infiel ou herege ha muito excomungado,
« Do inferno a chorar em chammas abrazado.
« Pobre louco! Inda a esperança os males enganando,
« Vaguê á meia noite e em gritos, suspirando,
« Vae dos christāos piedade e rezas implorando.
« Santos, emmudecei-o! Oh! Santa Mãe, não valha
« Teu rôgo a quem penando até ver a mortalha
« Da ira de Deus arde sempre na fornalha!